Estranho que o “Quadrado negro sobre fundo branco” do pintor russo Kasimir Malevich (1879-1935), ainda não tenha sofrido censura woke. No entanto – como a imbecilidade caminha a passos largos e se alastra perigosamente –, um dia este pintor talvez seja banido por ter possuído também lampejos de mediocridade ou ter-se revelado “fã de piadas duvidosas”.
Em 2015, após análise detalhada ao microscópio e por radiografia do famoso trabalho monocromático de 1915, surgiram outras duas composições, uma delas cubista, escondidas sob a tinta. E – surpresa! – também uma frase pseudo-humorística em russo, escrita pela mão do artista: “Negros brigando em um porão”.
Malevich certamente foi inspirado pelo desenho do escritor e humorista francês Alphonse Allais (bem conhecido nos círculos intelectuais russos da época) que, em 1897, legendara um retângulo preto como “Luta de negros em um porão durante a noite” o que, na época podia ser engraçado e inspirador. Hoje, não tem graça nenhuma.
Pobre Malevich! Ele mesmo confessou que foi muito atormentado pelo “Quadrado Negro”, trabalho que carregava tantos desafios estéticos: “Eu não podia comer, nem dormir”, disse. Queria “compreender o que tinha feito”.
Talvez aquele título ridículo na tela, escondido depois, fosse o traço de uma das etapas da sua “compreensão” do próprio quadro. Se foi isso, que lástima!
‘Coisa de russo’
Talvez essa descoberta faça entender, hoje, a inépcia da qual podem ser acometidos os apoiadores e acólitos de Putin. Eventualmente – sem nenhum racismo, apenas em nome do humor – bem que pode ter sido “coisa de russo”, sob efeito etílico de vodka, não?
Mesmo que, para explicar aquele trabalho aos outros e a si mesmo, o mestre tenha passado por várias dúvidas e sentimentos, e que artistas sejam humanos falíveis como todos nós, a “piada” encontrada nessa sua ânsia de interpretação fica como o momento mais desajeitado do artista. Vindo de Malevich, “negros brigando em um porão” foi um verdadeiro lampejo de mediocridade que teríamos preferido não conhecer.
Não merece “censura woke”, claro que não. Mediocridade nunca teve cacife para punir mediocridade. Ainda menos, pobreza woke. Mas a pequena frase descoberta na tela, decepciona bastante o nosso olhar sobre o criador (e a criação) do suprematismo, movimento maior da arte moderna abstrata, no século 20.
Até a próxima, que agora é hoje, e esses fatos são a pensar!