Os nefandos da Suprema Corte nos Estados Unidos decidiram que abortar não é mais um direito, mesmo em casos de estupro. A sentença, que reverte uma decisão tomada pelo mesmo tribunal há meio século, é uma bomba na vida das mulheres e da política americana. Enquanto alguns países progridem, os bárbaros religiosos da extrema-direita americana, copiados pelos conservadores e integristas brasileiros (como a juíza imbecil que tentou destruir a vida de uma criança) – uns e outros contra o aborto e a favor das armas – fazem suas pátrias regredirem à Idade Média.

Dos 194 países do planeta, apenas 10 concedem às mulheres exatamente os mesmos direitos legais que aos homens, de acordo com o relatório publicado recentemente pelo Banco Mundial. São eles: França, Bélgica, Dinamarca, Letônia, Luxemburgo, Suécia, Canadá, Islândia, Portugal e Irlanda.
Na Índia, Afeganistão, Síria, Somália, Arábia Saudita, Kuwait, Paquistão, República Democrática do Congo, Iêmen, Nigéria, Sudão etc., as desigualdades e outras violações dos direitos humanos persistem. Em países como a Polônia, Hungria, Rússia, China, Estados Unidos, esses direitos retrocedem.


Último recurso para situações sem saída
Simone Veil (1927-2017) foi uma magistrada, cientista política, e política sobrevivente do Holocausto, que pertenceu à Academia francesa de Letras e exerceu vários cargos, entre eles o de ministra da saúde na França. Hoje ela se encontra no Panteão, ao lado dos grandes personagens que marcaram a História deste país, como Voltaire, Jean-Jacques Rousseau e Victor Hugo, entre outros.
Veil foi encarregada de apresentar ao Parlamento um projeto de lei que despenalizava o aborto. Este combate, apoiado pela parte esclarecida da sociedade francesa (artistas, cientistas, professores, filósofos e intelectuais) lhe valeu ameaças da extrema direita, direita e extrema esquerda.
Num discurso que ficou famoso, ela afirmou que o aborto deve continuar como uma “exceção”, o “último recurso para situações sem saída”. O texto foi finalmente aceito na Assembleia nacional em 1974 e a lei adotada pelo Senado, duas semanas mais tarde, entrando em vigor em 1975.
Simone Veil se opunha à “banalização do aborto”, prática que, segundo ela, “permaneceria sempre um drama”, mas precisou que “se a sua lei não o proibia, ela não criava nenhum direito a ele.” A despenalização do aborto foi um avanço civilizador, uma grande vitória e um passo decisivo em favor das mulheres, de seus direitos e sua proteção, no primeiro mundo.
O seu lindo rosto é a melhor resposta ao obscurantismo
A vida de Simone Veil, como disse uma senadora, é um “apelo à recusa de todos os compromissos com os extremistas, os populistas, os mercadores de infelicidade.” De fato. Porém, é melhor não contrapor um personagem civilizado e civilizador a esta caterva conservadora e fundamentalista. Ele não merece. Deixemos que repouse em paz no Panteão. Apenas o seu lindo rosto, que hoje é o mesmo de “Marianne”, efígie da República francesa, é a melhor resposta ao obscurantismo.
Basta ver as caras e figuras monstruosas dos fanáticos americanos da América profunda de Trump e cotejá-las à bela, culta, esclarecida e evoluída juventude americana, para vislumbrar que, ali também, não há comparação possível. Intelectuais, historiadores e artistas já lançaram luz sobre esta civilização e sua complexa e tão díspar sociedade.
Até a próxima, que agora é hoje e todos precisam saber: muito longe de qualquer observância e preceito religiosos, o aborto é um direito fundamental da mulher!