Minha teoria de dona de casa

Um respeitável empresário e colecionador, presidente do que foi a maior instituição artística brasileira nos anos 1980 (hoje em desabalada decadência, hélas!), convidou-me dizendo que “acreditava que eu poderia ser boa curadora-geral, não especialmente porque era idônea crítica de arte, mas porque mostrava ser boa dona de casa”. Conhecendo-o, não tomei a observação como sexista ou machista, muito ao contrário. Além de considerar que a sua conclusão nascia do bom senso, fiquei bastante orgulhosa. De fato, julgo que donas de casa deveriam contribuir mais com os destinos políticos e geopolíticos de países. 

O sistema de defesa de Israel lança mísseis para interceptar 40 dos mais de 300 foguetes disparados. Imagens do Vale de Hula, no norte de Israel, em 13 de abril de 2024. (Ayal Margolin/JINI via Xinhua)

Assim, concedo-me o direito de interpretar certos fatos e tecer teorias. Penso agora, por exemplo, que o governo do Irã, além de teocrático, retrógrado e monstruoso, é burro. Caiu na pior arapuca, no mais incrível conto do vigário que poderia ter caído. Isso, sem falar na sua indigência militar. Mais de 100 mísseis que também lançou, além dos 300 interceptados no último fim de semana, deram chabu.

Veja se você concorda

Veja se você concorda com minha teoria. Um carro-bomba explode no sábado, 13 de abril (dia do ataque iraniano), no mesmo bairro de Damasco que abriga o consulado do Irã, já destruído naquela explosão no “Dia da Mentira”, 1 de abril, que matou sete membros do Corpo dos Guardiães da Revolução, o exército ideológico de Teerã. Dois figurões estavam entre as vítimas. O novo ataque ocorre em meio a tensões exacerbadas, com o Irã prometendo retaliar. Teerã e Damasco culpam Israel pelas duas agressões, sendo que este não confirma seu envolvimento, mas todo mundo sabe que foi ele.

Assim como todo mundo sabe que essas tensões estão no contexto da guerra entre Israel e o Hamas, desencadeada em 7 de outubro de 2023 por um ataque bárbaro e nojento, sem precedentes, do movimento islâmico palestino contra o Estado hebreu, que lançou em resposta uma grande operação militar na Faixa de Gaza para acabar – não com os palestinos – mas com o Hamas.

Se tivesse que acabar com os palestinos, Israel já teria acabado há muito tempo. O fato é que existem milhares deles vivendo e trabalhando em Israel, desde sempre. Muitos, anteriormente, vindos da faixa de Gaza e voltando à ela, todos os dias, em liberdade. Sem dizer o quanto este país os ajudou na construção de escolas, hospitais e outras infraestruturas na faixa deles. Pobres palestinos, hoje massacrados, manipulados e usados como escudos pelo Hamas, Hezbollah, Irã e aliados.

Minha teoria

Muito bem, é aqui que entra a minha teoria.

Sabe-se que falta alguns meses para que o Irã obtenha porcentagem suficiente de seu ingrediente de cozinha para conseguir terminar a receita da bomba de choco… Ops! Quero dizer, bomba nuclear de urânio.

Sabe-se também que os Estados Unidos se afastaram bastante de Israel, por conta dos estragos na faixa de Gaza, com os quais ninguém está feliz, eu tampouco.

Então, na minha teoria, o Estado hebreu, sabendo que haveria desproporcional vingança do Irã contra si (com a ajuda dos demais inimigos aliados); sabendo que os Estados Unidos (assim como o resto inteiro do G7 – França, Canadá, Japão, Reino Unido, Itália e Alemanha), voltaria a ficar de seu lado; sabendo que, aí sim, poderia não só se defender com o domo de ferro, como responder depois, atacando o inimigo de volta – decidiu que provocaria tudo isso com as explosões do “Dia da Mentira” e a do último sábado.

Quociente de inteligência

A minha teoria de dona de casa é de que tudo isso teve apenas um objetivo. Poder, agora, legitimamente, investir o oponente de maneira direta, dentro do território dele, tomando como alvo suas instalações militares e… Sobretudo a cozinha, onde estão os mestres-cucas guardiães da revolução! A cozinha que está enterrada nas profundezas de uma montanha, segundo mostraram as fotos e os vídeos de satélites revelados pela Associated Press.

© Stefan Jürgensen/Flickr

Quem é que não sabe agora, que a República Islâmica cavou túneis nas montanhas de Zagros, perto do local nuclear de Natanz e constrói uma infraestrutura atômica? Claro que fez isso, pensando que seus liquidificadores e varinhas mágicas, tão profundamente soterrados, estariam fora do alcance de um bombardeio. Como se os Estados Unidos não pudessem ajudar Israel (mesmo dizendo que não o farão) oferecendo seus mísseis de longo alcance que furam metros e metros de profundidade. Mísseis estes, que nenhum país ainda possui.

Claro que o Estado hebreu vai ripostar

A minha teoria é de que tudo isso foi orquestrado para que Israel, com a ajuda secreta dos americanos, consiga destruir, ou pelo menos retardar, a fabricação desses pratos nucleares indigestos que ameaçam o mundo, inclusive o mundo árabe.

Claro que o Estado hebreu vai ripostar (como o chefe do exército israelense prometeu hoje, dia 15). Para que nunca mais aquele governo burro e hostil consiga terminar a sua receita da bomba de choco… Ops! Quero dizer, bomba atômica de urânio.

E para que Israel, mais uma vez, prove que é muito bom de QI, estratégias e culinária. País que foi o grande vencedor na defesa contra o absurdo ataque na noite do último sábado, 13, para domingo, 14.

Até a próxima, que agora é hoje e apesar de o presidente brasileiro ser cúmplice – aliado da República islâmica, antissemita amigo de governos totalitários antissionistas, ou seja, que desejam a destruição de um Estado legítimo, único país democrático no Oriente médio – Israel nunca foi tão apoiado pela comunidade internacional! Merece um ótimo Tcholent (prato que sempre faço, com a receita de minha avó) no próximo Shabat, antes de atacar. Congratulações aqui, de uma “boa dona de casa”!

‘Genocídio seletivo’ ou ‘Por que Lula e Caetano Veloso não agitam a bandeira da oposição síria?’

Em 13 anos, na Síria, foram massacradas 500.000 pessoas, metade delas civis: homens, mulheres e crianças. Durante os governos de Lula e sobretudo de Dilma, a Síria era um país em migalhas. O conflito foi desencadeado em 2011 com a repressão de protestos pró-democracia em Damasco e envolveu múltiplos atores regionais, além de grandes potências, jogando milhões de pessoas nas estradas do exílio. Por que Lula e Caetano nunca agitaram a bandeira que hoje é símbolo da “independência da Síria”?  Por que Caetano dança, dá pulinhos e risadinhas enquanto mostra, leve e alegremente, a bandeira (ao contrário!) de uma Palestina em desgraça? É porque está contente com o massacre de 7 de outubro, com a tomada de reféns e a guerra trágica de Israel contra o Hamas terrorista que já fez milhares de vítimas de todos os lados?  Ou é por mimetismo, por querer imitar aquela antissionista e antissemita esquerda, sempre “festiva”? 

A “bandeira da oposição” ou a chamada “bandeira da independência” foi oficialmente adotada e é amplamente utilizada até hoje pela Coalizão Nacional Síria e pelo Exército Sírio Livre. Ela, de fato, representou o país durante a paz, antes do golpe sangrento do Baath, em 1963, partido do tirano Bashar Al Assad.

Partido Socialista Árabe totalitário e sanguinário, o Baath, é uma mistura ideológica de nacionalismo, panarabismo, socialismo árabe e anti-imperialismo. O baathismo pedia a unificação do mundo árabe em um único estado. Seu lema, “Unidade, Liberdade, Socialismo”, refere-se à unidade árabe, à “liberdade” do controle e a interferências não árabes.

Nos anos de Dilma, na Síria – pior, talvez, do que em Gaza – não havia eletricidade, nem pão, nem gasolina. Além da fome, milhares eram mortos sob tortura nas prisões do regime. Foram vários os massacres. A esmagadora maioria de vítimas se estendeu entre o final de 2012 e o final de 2015, enquanto o PT se encontrava no poder. Ninguém, nenhuma anta ou Gleisi Hoffmann, nenhum Lula se manifestou. Nenhum José Genoíno pediu para boicotar alauitas e sunitas no Brasil.

Os ataques do regime sírio, sob o partido Baath, e das milícias aliadas foram responsáveis pela maioria desse genocídio, palavra que, aqui sim, pode ser utilizada. Não tem absolutamente nada a ver com o que ocorre hoje em Gaza.

Genocidas apresentam ‘planos de salvação’?

Há pouco, quando Israel preparava a sua ofensiva terrestre em Rafah, os militares israelenses apresentaram em comunicado “um plano para a evacuação das populações das zonas de combate, bem como um próximo plano de operações”. Genocidas apresentam “planos de salvação”?

Rafah é o “último bastião” do movimento islâmico terrorista, o Hamas que, apesar das propostas israelenses de trégua, devolução dos reféns e troca com prisioneiros, não responde. E não responde, não porque não sabe (apesar do caos que deve estar ali), mas porque certamente quer que Israel mate seu povo, os palestinos, e que imbecis continuem a condenar o Estado Hebreu como “genocida”, quando o grande “exterminador” é o Hamas.

Segundo especialistas, graças a esta guerra – que, como todas as guerras é terrível e provoca perdas irreparáveis – “Israel não está longe de uma vitória total sobre o grupo terrorista.”

O amigo de Lula

Nos massacres perpetrados por Bashar Al Assad, mais um ditador “socialista” amigo de Lula, genocidas também morreram. Entre os não-sírios aliados de Damasco, milhares de combatentes do movimento xiita libanês Hezbollah terrorista, aliado do Hamas, foram da mesma forma, sacrificados.

Em 2021, o tirano Bashar Al Assad, presidente da Síria, foi reeleito com 95,1% dos votos, enquanto eram documentadas mais de 60 mil mortes nas prisões do governo e outros centros de detenção do regime. Quase 50 mil detentos morreram sob tortura.

De 2011 até hoje, jihadistas do Estado Islâmico continuam o genocídio.

Durante a Guerra Civil Síria ficou provado o uso de armas químicas por Bashar Al Assad:  gás sarin, cloro e gás mostarda. De acordo com ONGs médicas e humanitárias, elas causaram milhares de mortes do final de 2012 a meados de 2017, principalmente entre civis.

Houve vários massacres, porém, um mês depois da devastadora chacina de Ghouta, no dia 21 de agosto de 2013, o presidente Lula disse à imprensa que “duvidava que o regime do presidente sírio guardasse armas químicas” e, mais, “que as tivesse lançado contra rebeldes”. Lula afirmou, na ocasião, que “a suposta existência de armas químicas na Síria seria um pretexto da comunidade internacional para intervir no país do Oriente Médio – como foi feito com o Iraque ao dizerem que havia armas de destruição em massa em seu território.”

Claro que tudo que acontece hoje no Oriente Médio, a regressão e o caos que atingiram o Iraque, entre outras coisas como o aparecimento do Estado Islâmico, foram provocados pela ignorância norte-americana da complexidade desses países, muito particularmente a de Bush. Mas, que indecência do presidente brasileiro fazer essa comparação! Aliás, Bashar Inácio Lula da Silva é o mestre das comparações absurdas e gafentas, umas das quais, mais recente, o levou inclusive a ser “persona non grata” em Israel.

Em 2017, quando ficou definitivamente comprovado que Al Assad lançava armas químicas contra oponentes sírios, Lula – provavelmente mais preocupado com os preparativos para o depoimento que daria ao também deplorável juiz Sergio Moro na Lava Jato, e com a eleição para a presidência do PT – ficou mudo.

Em 2023, o ditador sírio tentou uma “normalização”. Conseguiu a reintegração do seu regime na Liga Árabe, após uma década de exclusão do cenário internacional. Nem por isso, deixou de ser o que realmente é: um atroz, sócio de Lula no Sul global contra o Ocidente democrático, assim como o é Putin, execrável amigo dos dois.

Em 2 de março de 2022, os 193 países membros da Organização das Nações Unidas (ONU) votaram a resolução na Assembleia Geral que condenava a guerra na Ucrânia. 141 países votaram a favor, 35 se abstiveram, 12 representantes de países estavam ausentes na votação e 5 votaram contra. Quais? Rússia, Bielorrússia, Coreia do Norte, Eritreia e… Síria. Claro.

Se jamais empunharam a bandeira que hoje é símbolo da “independência da Síria”, o presidente brasileiro e Caetano Veloso tampouco agitariam a do “Exército Livre da Síria” que é igualmente simbólica da democracia e de um estado secular. Afinal esse é o grupo que está à frente da Guerra Civil, contra o verdadeiro genocídio, lutando para instaurar um Estado de direito. Grupo que jurou lealdade à Coalizão Nacional Síria, principal oposição do país.

Evidentemente, as coisas em países como esse são muito mais complexas do que a maneira como as apresento. Não poderia ser de outra forma. Não sou especialista, o que transmito são observações, não ciência. Na verdade, nem mesmo cientistas políticos ou especialistas em geopolítica, conseguem discernir, de seus “laboratórios”, certos pormenores.

Alain Grenier (1930-2022), querido amigo – que, enquanto diplomata, esteve em Damasco de 1964 a 1968 e conheceu Hafez el-Assad (1930-2000), pai de Bashar – dizia que para “nós ocidentais é praticamente impossível chegar perto daquela complexa cultura.” Contava que a Síria “é formada por tribos e suas autoridades políticas, sendo que cada um deve escolher o grande chefe ao qual prestará obediência e do qual receberá proteção”. Eu respondia, para fazer humor, que para nós, ocidentais, aquele sistema soa como “mafioso”, de “milícias”. Ele me repreendia, sorrindo: “Nada disso! É cultural! São países formados e regidos por grupos sociais, que ocupam territórios específicos, às vezes compõem-se até mesmo de clãs, ou seja, fundados sobre o parentesco.”

De fato, quanto mais aprendemos, mais vemos o quanto não sabemos. Todavia, há coisas que enxergamos bem.

Até a próxima, que agora é hoje e é elementar, meu caro Watson! A esquerda festiva brasileira (e baiana) balança as cadeiras e agita a bandeira errada porque a Síria “não é fruto do sionismo”, o regime sírio é “ditatorial socialista”, “genocídios são seletivos” e… last but not least (por último, porém não menos importante) Bashar Al Assad não é judeu!

O ex-presidente Lula cumprimenta Bashar al Assad, em visita de Estado do presidente da Síria ao Brasil, em 2010 (Foto: EVARISTO SA/AFP)
Bandeira que hoje é símbolo da “independência da Síria”, e representava este país antes do golpe sangrento do Baath, o partido nacional socialista do tirano Bashar Al Assad.
Manifestação em Babila, nos arredores de Damasco.
Bandeira do Exército Livre da Síria.