O ateliê de Romain Naufle situava-se a alguns passos de onde moro, a 2 km do Bataclan, casa de show em Paris. Desde que o lugar abriu, tomei o hábito de parar em frente de sua vitrina durante alguns minutos, apenas para vê-lo trabalhar. Eu não era a única. Romain, reparador e vendedor de instrumentos musicais de corda, foi um jovem luthier querido por todos no bairro e a sua butique, um espaço vivo, modesto e acolhedor.
À esquerda ficavam os violões, guitarras e violinos pendurados na parede. À direita, numa espécie de banco de lenho cor de mel, ele colocava as ferramentas que se pareciam com aquelas usadas pelos marceneiros. Os passantes detinham-se fascinados pelos pedaços de madeira, alinhados atrás da vitrine, que um dia seriam os braços de algum instrumento de corda. Ele costumava contar, entre outras coisas, que uma certa “madeira africana era excelente para tocar blues”.
Hoje, nas ruas de Paris, exceto os sapateiros, é muito raro ver um artesão trabalhar. De fora, podia-se observar o crânio de Romain, precocemente calvo, sempre encurvado sobre um destes instrumentos. Nunca se incomodava com interrupções. Ao contrário, acolhia qualquer pessoa que adentrasse o seu pequeno templo, com um grande sorriso. Em 2015 ele não tinha mais do que 31 anos, mas trabalhava com a serenidade de um homem de experiência.
Amor à música e à liberdade
Romain Naufle, o apaixonado “médico dos violões”, como era chamado, estava no Bataclan para festejar com amigos e morreu no dia 13 de novembro de 2015, uma sexta-feira, há exatamente seis anos, crivado de balas dos terroristas que ensanguentaram Paris. O julgamento deles neste momento, e do covarde que restou, nos revolta e apazigua ao mesmo tempo. Acompanhamos, pela imprensa, cada momento do processo.
Desde que a porta de ferro de sua lojinha permaneceu cerrada e cobriu-se de flores e mensagens, a nossa vida não é mais a mesma. As crianças colaram ali palavras ternas e pungentes: “obrigada pelo violão”, escreveu Candice; “você é meu companheiro”, assinou Paul.
Ainda não posso passar pelo número 18 daquela rua sem me lembrar que durante semanas a sua calçada transformou-se numa capela ardente.
Lembro da figura de Romain e do que ela representava em termos de amor à música, ao seu ofício e à liberdade. Ele ficará em nossas memórias para nos defender do fanatismo e obscurantismo, os dois maiores perigos da humanidade.
Até a próxima que agora é hoje, tantos ainda tentam ressuscitar o gosto pela festa no Bataclan e em toda a cidade, porém ninguém consegue trazer de volta a despreocupação e alegria do mundo do jovem luthier!
França começa a julgar acusados por atentados terroristas de 2015 em Paris



