Linda maneira de compreender nosso mundo

Uma bonita e nova forma de vermos o mundo é, penso eu, coisa bastante apropriada numa Páscoa, seja ela judaica ou não. Sim, porque descobri uma conclusão de estudo que talvez mude a sua visão, revele as falsas ideias que talvez lhe tenham sido instiladas no decorrer do tempo, como a mim também foram.  Antes, porém, cozinhei uma pequena anedota.

Bandeja para cada um dos alimentos simbólicos que representam o Êxodo do povo hebreu, no seder, o jantar cerimonial da Páscoa judaica.

Um garoto chega da escola hebraica, larga no chão a maleta cheia de livros e joga-se no sofá, pensativo.

O pai pergunta:

“O que você aprendeu hoje, Rafael?”

O adolescente responde:

“Na segunda-feira, dia 22, começa Pessach, a Páscoa judaica que não tem ovos de chocolate nem coelho, mas tem sopa de bolinhas e vai até o dia 30 de abril.”

“Foi só isso que você aprendeu?”

“Não. O rabino também nos contou como é o Sêder, aquele jantar que a vovó e o vovô sempre fazem para a família inteira no primeiro dia do feriado, e que toda criança adora, principalmente quando lê as histórias no livro do Hagadá e vai procurar a Matzá escondida, para ganhar presente. A gente fica recordando a história do êxodo e a libertação do povo de Israel…”

“Verdade que em toda festa judaica come-se, come-se e come-se…  Mas o rabino só ficou falando de comida?”

“Claro que não! Ele contou também como foi que Moisés levou os filhos de Israel para fora do Egito”.

“E você lembra como foi?”, interroga o pai.

Montagem sem I.A. e sem PhotoShop, feita com Código aberto gratuito (Open source) ©️Sheila Leirner

Um pouco embaraçado, Rafael conta como foi que Moisés levou os filhos de Israel para fora do Egito:

“Foi assim: Moisés era um homem muito forte, mesmo aos 80 anos. Ele recebeu um e-mail de Deus. Era uma ordem para que libertasse o povo hebreu, maltratado pela escravidão no Egito. Moisés repassou a mensagem ao faraó. O faraó respondeu com um emoji: ‘👎’. Então, Moisés dedo-durou o soberano egípcio a Deus, que reagiu com outro emoji: ‘😡’. Aí, o Criador do universo fez uma pesquisa no Google (que ele também tinha criado) para saber quais eram as piores pragas do mundo e encomendou todas, na Amazon. Como tinha “Prime”, não pagou o frete e, já no dia seguinte, o país ficou infestado de rãs, piolhos e gafanhotos, entre muitas outras. Os bichos subiam até mesmo nas pirâmides.”

“Você tem certeza de que o rabino contou isso?”

“Sim. Aí, o faraó, assustado, voltou atrás. Criou um grupo WhatsApp e avisou Moisés: ‘👍’. Moisés tuitou no “X” ex-Twitter, provocando o êxodo do povo hebreu, que seguiu pelo deserto a caminho da terra de Canaã, orientado por Google maps. Alguns preferiram Waze. Depois dessa marcha de 40 anos, já na Terra Prometida, que hoje é Israel, encheram Instagram e Facebook com as imagens da travessia pelo Mar Vermelho, usando Inteligência Artificial e PhotoShop para parecer que as águas se abriam, de modo que pudessem passar em direção à liberdade.”

“Rafael!!!”

O garoto continua:

“A verdade é que Moisés tinha chamado um grupo incrível de engenheiros para construir uma ponte. Assim que chegaram do outro lado, a explodiram, enquanto os egípcios tentavam atravessar e todos caíram no mar. Um pouco como Israel ripostou há pouco, mandando drones às instalações militares e nucleares iranianas, de dentro do Irã, bem de fininho e em pequena escala, só para avisar aquele governo de m… que tome muito cuidado, porque o Mossad já está infiltrado no seu país e vai explodir tudo que seja fabricação belicosa de urânio. Bem… Faz muito tempo que tudo aconteceu, mas nós comemoramos o êxodo até hoje!”

“PelamordeDeus!” exclama o pai. “Foi isso que o rabino te ensinou, Rafael?!”

“Não exatamente. Mas, se eu não mudasse um pouquinho a história, você nunca acreditaria no que ele nos contou!”

Jeff Koons. Montagem sem I.A. e sem PhotoShop, feita com Código aberto gratuito (Open source) ©️Sheila Leirner

Pois é. Como escrevi no artigo em que desmascarei Edgar Morin, “no Hagadá , texto que lemos na noite da Páscoa judaica que segue o Purim, uma passagem diz que ‘em cada geração surgiram pessoas para nos destruir, mas o Senhor, com a sua mão, nos salvou das mãos delas.'” Em Purim, por exemplo, lembramos quando os persas tentaram nos matar. Neste feriado, os judeus comemoram, com reco-reco, máscaras, fantasias, comidas (é claro!) e muito barulho, a salvação de seus ancestrais que escaparam da fúria de Hamã, primeiro-ministro do rei Assuero, com o exílio no Império Persa. Isso, graças à linda rainha Ester. Em Chanuká (Natal judaico), lembramos quando os gregos tentaram nos matar; e em Pessach, também recordamos – como contou Rafael – quando os egípcios tentaram nos matar.

Símbolos de Purim: delicioso doce “orelha de Hamã”, máscara e “reco-reco” para o barulho.

Estiveram sempre tentando nos matar. Alguns conseguiram, mas continuamos presentes para poder desejar, ecumenicamente, muita paz e feliz Pessach, assim como já desejamos uma linda Páscoa cristã aos amigos e leitores queridos de diferentes religiões.

Uma bela maneira de compreender nosso mundo

Mas a Páscoa judaica, penso eu, é também a ocasião de tomar conhecimento de um relatório que talvez mude a sua vida, visão de mundo e as falsas ideologias que talvez lhe tenham sido instiladas, no decorrer do tempo, como a mim também.

Acredito que países felizes são aqueles que preservam suas tradições, culturas e histórias, que não necessariamente têm a ver com a religião.

Por isso, aproveito o Pessach para trazer o resultado do Relatório Mundial da Felicidade (World Happiness Report) de 2024, anunciado há menos de um mês.

Essa pesquisa concentra-se, desde 2012, na felicidade das pessoas em diferentes estágios de sua vida. Nas sete idades do homem, segundo “As You Like It”, de Shakespeare, os estágios finais são retratados como profundamente deprimentes. No entanto, essa pesquisa da felicidade mostra um quadro bem mais sutil, que muda com o tempo.

O Relatório é anual e coisa muito séria: uma parceria da Gallup, do Centro de Pesquisa de Bem-Estar de Oxford, da Rede de Soluções de Desenvolvimento Sustentável da ONU e do Conselho Editorial da WHR, formado por especialistas.

Reflete uma demanda mundial por mais atenção ao estado de uma consciência plenamente satisfeita, como critério para políticas de governo. Analisa e acompanha a situação da felicidade no mundo, mostrando como a ciência dedicada à questão explica as variações pessoais e nacionais do bem-estar.

Resultado

Vale muito a pena ler o resultado de 2024, para obter as últimas descobertas no nosso planeta, em todas as idades.

São 143 países. Reproduzo apenas os 10 últimos (os mais infelizes), e os 10 primeiros (os mais felizes). Penso que é uma belíssima (e triste) maneira de compreendermos o mundo no qual vivemos.

O Afeganistão continua na lista, numa classificação praticamente inalterada, em 12 anos.

Os mais infelizes

  1. Zâmbia
  2. Eswatini
  3. Malawi
  4. Botswana
  5. Zimbábue
  6. Congo
  7. Serra Leoa
  8. Lesoto
  9. Líbano
  10. Afeganistão

Quanto à lista dos dez primeiros países de 2024, ela também permanece praticamente inalterada:

Os mais felizes

  1. Finlândia
  2. Dinamarca
  3. Islândia
  4. Suécia
  5. Israel
  6. Países Baixos
  7. Noruega
  8. Luxemburgo
  9. Suíça
  10. Austrália

Lendo a lista completa que indico aqui, você certamente se perguntará: por que os Estados Unidos estão em 23°, Alemanha em 24°, França em 27°, Brasil em 44°, Rússia em 72°, Venezuela em 79° e Israel – país em guerra – que sofre o ataque de bárbaros e defende-se há décadas do terrorismo e islamismo radical – é um dos países mais felizes do mundo?

Preservar suas tradições

Como afirmei acima, penso que preservar suas tradições é fator fundamental para a felicidade de um povo. É por isso que países como a França ou a Alemanha não estão entre os primeiros. Neles, tudo isso foi perdido. Mesmo o Natal ficou puramente comercial. Quanto aos EUA, o país não perdeu nada, porém não é feliz porque nem teve tempo de formar uma tradição.

Acredito que, além da tradição, também só se pode ser feliz, dentro da civilização, liberdade, autodeterminação, cultura e democracia. Além de que, como disse um amigo querido, “só somos felizes quando existimos.” Eu completaria: e quando lutamos para existir. Como Israel.

Chag Pessach Sameach a todos!  Ou seja, “Feliz Festa da Travessia”. Que, para nós, este seja o caminho de nossas vidas, com esperança. Até a próxima, que agora é hoje e lembremo-nos sempre de que a mesma fórmula do bem-estar e plenitude de países, também vale para nossa felicidade pessoal!

Esse é o meu Hagadá amado, de várias décadas, prefaciado e comentado por Elie Wiesel, com ilustrações de Mark Podwal.

Natureza sem I.A.

São apenas bolhas efêmeras de sabão que, em contato com o frio, congelam. Devaneios que encontrei por serendipidade. O resultado é uma fantasia cuja inteligência que não tem nada de artificial. Tudo nela é verdadeiro, assim como nossos sonhos, quando dormimos.

“Na obra do verdadeiro artista, intenção e resultado são uma coisa só. Em bolhas congeladas também.”

 

A membrana das bolhas é composta por três camadas: uma de moléculas de água, ensanduichada entre duas de moléculas de sabão. Em princípio, a água congela a 0° C, mas para essa combinação química e solidificação, a temperatura necessária fica mais próxima de -15°C. A camada de água congela primeiro, seguida pela de sabão. A temperatura precisa ser exata para obter a cristalização porque a menor alteração, como a chegada de um raio de sol, pode fazer com que a bolha exploda.

A temperatura e o nível de umidade afetam a formação dos cristais, que se dividem em quatro tipos principais: estrelas, placas, agulhas e cilindros. Eles também mudam em acordo com qualquer mudança meteorológica como o vento, o sol ou a chuva.

A luz que passa por uma película de água com sabão é parcialmente refletida pelas superfícies superior e inferior da membrana. É a interferência entre a luz refletida pela película e a luz que retorna – depois de ter viajado para frente e para trás dentro da película – que causa suas variações de cor. A espessura do filme afeta a cor igualmente.

O resultado é uma fantasia cuja inteligência que não tem nada de artificial. Tudo nela é verdadeiro, assim como nossos sonhos, quando dormimos. Utópica a ponto de me fazer lembrar um pouco Jean d’Ormesson, sobre quem escrevi quando ele faleceu, há seis anos.

 

“Escritores compõem centenas de páginas sobre personagens dos quais ninguém sabe nada. É uma maneira de contemplar o universo em uma bolha de sabão.”

 

Ormesson (1925-2017), foi um escritor francês, membro da Academia francesa e autor de 40 livros, entre afrescos históricos imaginários e ensaios filosóficos sobre a vida, a morte e a presença de Deus. Escritores como ele conseguem escrever centenas de páginas sobre personagens dos quais ninguém sabe nada. É uma maneira de contemplar o universo em uma bolha de sabão.

Muitas pessoas não gostam da sua obra. Entendo isso. Ele foi o mestre da “felicidade elegante”. Acreditava na alegria e maravilha da existência, apesar das provas materiais contrárias que se acumulam no dia a dia do nosso planeta.

Pois eu, seis anos depois, com tudo que passamos nesse intervalo, continuo a adorar e respeitar quem é capaz de dar o mesmo peso e valor às provas lógicas (e abstratas) – como o amor e a fé, por exemplo – de que a vida, de maneira inversa, vale muito, mas muito mesmo, a pena de ser vivida, nem que seja só para olhar o belo e o sagrado… sem I.A.

Na obra do verdadeiro artista, intenção e resultado são uma coisa só. Em bolhas congeladas também.

Até a próxima, que agora é hoje e obrigada aos experimentadores, graças aos quais descobri, compilei e desvendei essa magia e devaneio que podem ser arte para quem decidir que são!

Retrato de Jean d’Ormesson, anos 1980, França. ©Getty – Robert VAN DER HILST/Gamma-Rapho