Estamos caindo como patinhos

A estratégia perversa (manjada em outros países, porém jamais usada no Brasil) tem três atos:

1° – Preenche-se o governo com pessoas ruins, incompetentes e inimigas dos assuntos de suas pastas.

2° – Orienta-se cada atroz a fazer uma declaração mais estapafúrdia do que a outra, ocupando espaço na imprensa e nas redes.

3° – Estimula-se o falatório, bom ou mau, a fim de mostrar “autoridade”.


O objetivo? Reforçar um governo centralizado, populista, nacionalista, autoritário e autocrata – exatamente o que está acontecendo no nosso país, em ritmo acelerado.

Trata-se de um método de sideração, como o que ocorreu na Itália de Salvini e felizmente terminou. Ninguém sai às ruas porque as pessoas estão sideradas, paralisadas. Ora, além da estratégia perversa, que é externa – certamente orientada pelo satânico Steve Bannon e o “guru” de Virgínia (é bom lembrar que o novo psicótico, agora diretor da Funarte, foi aluno dele) – existe igualmente uma neurose interna que permite a este governo existir. Exemplo que todos conhecem: aquele tipo de casal, completamente neurótico, que não pode viver separado porque um depende das neuroses do outro. O casal Bolsonaro-Lula também está nessa, por oposição.

Charge de João Montanaro, publicada no jornal Folha de S. Paulo em 11 de novembro, 2019.

Pois é. A crescente “família governamental” brasileira, que agora tem membros em todas as pastas, é assim. Funciona, não em oposição, mas em sintonia, dentro da estrutura psicopatológica da qual também necessita para existir.

‘Conteúdos proveitosos ou inspiradores’

A contra estratégia? Um pacto entre os órgãos fidedignos da imprensa e a sociedade civil. Não se noticia ou analisa nos jornais, rádios e televisões; não se compartilha ou comenta nas redes nenhuma destas provocações sensacionalistas.

Reconheço que é muito duro ficar quieto vendo o antirrepublicano chamado “sinistro da Deseducação” dançar de guarda-chuva e insultar as pessoas, e um diretor imbecil de instituição cultural dizer que a terra é plana ou que os Beatles foram comunistas.  O jornal Estadão, neste editorial, chegou até mesmo a exigir: “o ministro da Educação, Abraham Weintraub, tem de ser demitido imediatamente.”

Mas, se não for para ser contundente assim e apenas banalizar barbaridades, silenciar é o que todos deveriam fazer. Se todo mundo ignorasse as hostilizações e os ultrajes, a imprensa inclusive, o governo seria neutralizado neste aspecto. Aliás, qual é o interesse em reproduzir e comentar perversidade? Muda alguma coisa?

O silêncio, junto com a continuidade da avaliação, abordagem crítica, iluminação de problemas, indicação de falhas e contradições, questionamento das autoridades públicas e dos poderes privados, sempre buscando “conteúdos proveitosos ou inspiradores” – como está nas diretrizes editoriais publicadas pela Folha em 12 de março deste ano – estas são as nossas melhores armas.

Até a próxima, que agora é hoje e não caiamos como patinhos!  #Silêncio

Educação para aqui, para acolá

Hoje, dia 2 de setembro, começa o ano escolar na França. 12 milhões de crianças estão de volta das férias. Como sempre, o clima nas escolas será de euforia e transmissão dos valores republicanos que vêm do alto: liberdade, igualdade, fraternidade, laicidade e recusa de toda e qualquer discriminação. Do outro lado do Atlântico… 

Foto: Robert Doisneau (1912-1994), Escola da rua Buffon, Paris Vème, 1956.

 

Na França, fora das alocações obrigatórias de ajuda a todos os pais, cada família modesta já recebeu este mês do Estado, em sua conta bancária, entre 368,84 euros (1.680,00 reais) et 402,67 euros (1.835,00 reais) por criança, segundo a sua idade, para a compra de material escolar. Se a família é “menos do que modesta”, ela tem direito a uma alocação diferencial. Recebem as crianças e jovens escolarizados, entre 6 e 18 anos.

As escolas são públicas e totalmente gratuitas, desde 1881. O ensinamento público é laico (separado da religião) e a instrução é obrigatória desde 1882, a partir dos 6 até os 16 anos, quando o adolescente pode optar por formações no campo que quiser, entrar na universidade (também gratuita), etc. Como as aulas vão da manhã até à tarde, todas os estabelecimentos possuem refeitórios e as refeições são praticamente gratuitas. Os alunos pagam apenas um preço simbólico por elas.

A escola deve transmitir o conjunto dos valores republicanos através de seus ensinamentos, da vida escolar e do conjunto das ações educativas que ela realiza. Entre estes valores estão: liberdade, igualidade, fraternidade, laicidade e recusa de toda e qualquer discriminação.

O ministro atual da Educação chama-se Jean-Michel Blanquer (1967). É jurista, professor, ex reitor e diretor das maiores escolas, institutos e academias francesas, cientista político, homem de letras e filosofia (com mestrados e doutorados) e melômano, cujo glorioso currículo dificilmente caberia neste espaço. Além da erudição, ele é fino, elegante, engraçado, charmoso, competentíssimo e respeitado por pessoas de todas as sensibilidades políticas, da esquerda até a direita. Junto com o literato (doutor em literatura), escritor e cientista político Bruno Le Maire, ministro de Economia do governo de Édouard Philippe/Emmanuel Macron, Blanquer também é perfeitamente presidenciável.

O Planalto obscurantista enxerga idiotas úteis em estudantes

No Brasil, o deseducado ministro da Educação, parcamente graduado, ex executivo do mercado financeiro, sem nenhuma experiência neste campo, acaba com bolsas, tira verbas, destrói instituições de ajuda e pesquisa, põe no chão as humanas, demole universidades, explode os estudos e a cultura. Em sua coluna do dia 30 no Estadão, Pedro Doria – criador do excelente Canal Meio (que tem um dos melhores newsletters do momento) – escreve que “ao invés de promover o encontro entre iniciativa privada e professores universitários, de quebrar o preconceito da academia brasileira com o capitalismo do século 21, o governo estimula o ódio à educação. Quando podia estar criando formas de estimular a geração de patentes e eliminar a burocracia para seu registro, tornar pesquisadores os grandes propulsores da nova riqueza nacional, o Planalto obscurantista os torna inimigos e, em estudantes, enxerga idiotas úteis.”

Além disso, o ministro brasileiro da Educação mostra-se grosseiro, escreve mal, comete erros crassos, troca nome de grandes escritores, comporta-se como palhaço, mete-se sempre onde não é chamado, e – como se isto não bastasse – xinga grandes presidentes de maneira cafajeste para chamar atenção, certamente obedecendo ao “Manual Bannon do Populismo para Governos Autoritários e Involuídos”, tão apreciado pela ala ideológica do governo brasileiro. Um apanhado prodigioso de declarações e posturas contestadas estão nesta excelente matéria do dia 23 de julho, no Estadão. Já dá para fazer outra.

Até a próxima, que agora é hoje e sugiro ao ministro de docta ignorantia, um frutífero estágio no Ministério da Educação Nacional em Paris, capital de um país para o qual a Educação é prioridade máxima! E viva a Bic que fez os francesinhos e francesinhas ficarem inteligentes!