Dalai Lama: escândalo da língua cai pior do que parece

Há um ano foram revelados, na França, os escândalos financeiros e a violência sexual no seio das comunidades budistas na Europa. A imagem da ‘religião da felicidade’ foi definitivamente manchada – com reportagem na tevê e em livro* – depois de uma investigação jornalística, que levou 11 anos. O ‘escândalo da língua’ pode ir mais longe do que se imagina.

Aquela apuração que chocou os franceses tanto quanto os casos parecidos ocorridos na Igreja, lançou luz sobre estupros de menores, abusos e múltiplos maus-tratos cometidos ao longo de 50 anos por eminentes lamas em várias comunidades budistas na Europa, particularmente na França.

O Dalai Lama, ganhador do Prêmio Nobel da Paz, foi informado das agressões sexuais contra mulheres e crianças, já em março de 1993. Até agora, ele e grande parte das altas autoridades espirituais tibetanas no exílio ignoraram as palavras e o sofrimento das vítimas, repetindo que “o assunto não é de sua responsabilidade.” A inação é total.

O fenômeno surpreendeu pela sua dimensão. Recolheu-se testemunhos de cerca de trinta vítimas de treze diferentes mestres budistas. E a maioria dos agressores continua ativa, dentro de uma doutrina que gozou até hoje de grande simpatia no Ocidente.

Filosofia de vida

Considerado como uma filosofia de vida, o budismo, nascido na Índia, cuja ramificação tibetana conseguiu se exportar para a Europa e a América do Norte graças a uma versão suave e adocicada, é, na verdade, uma religião como qualquer outra. Também pode mostrar grande violência, como acontece com o grupo de monges budistas extremistas e intolerantes que perseguem a minoria muçulmana Rohingya, na Birmânia.

O budismo é essencialmente dogmático, tem promessas de salvação e ameaças de inferno como corolário. Para acessar ao que é a “graça” no cristianismo, os discípulos do budismo devem se submeter à vontade do mestre, um verdadeiro guia espiritual. Esta é uma particularidade que, como se sabe, pode abrir caminho para disfunções e derivas. Sobretudo se o mestre for um doido de pedra e desonesto, como já aconteceu.

Até a próxima, que agora é hoje e o “escândalo da língua”, portanto, cai ainda pior do que é. Cultural ou não, brincadeira inocente ou não, com ou sem desculpas, mesmo se o Dalai Lama estiver gagá, esse gesto – inapropriado, aos olhos do Ocidente – faz lembrar que, de fato, doutrinas podem permitir a certos mestres qualquer coisa. Mesmo crimes de pedofilia.

Bouddhisme, la loi du silence, Élodie Emery et Wandrille Lanos